17/10/2006

O menino

Hoje é dia de greve dos professores.
A tutela mostra-se agastada sem perceber o motivo desta greve.
Pobre ministra/professora do superior, diga-se, em abono da verdade, que talvez devesse estagiar por uns dois a três anos no Básico e Secundário e desta forma perceber o porquê das contestações às aulas de substituição, às Salas de Estudo sem alunos, visto que estão a ter aulas de substituição, etc. etc. etc.
A pobre ministra, se viesse as estes níveis de ensino (e deviam entregar-lhe as piores turmas, de modo a ensinar-nos os novos métodos de trabalho e novas pedagogias) iria perceber as causas do insucesso e deixaria de falar em quotas, avaliações, despromoções, professores titulares, e aprender a respeitar os colegas que não tiveram a dita e a sua inteligência para serem todos convidados para o nível superior de ensino. Todos sabemos que quando chegam os caloiros, andam à deriva, perdidos no meio de corredores, salas de aula enormes, anfiteatros,..., sem haver vivalma para os acolher e os fazerem sentir-se bem na sua nova casa. Depois falam das praxes. Sou contra, mas é a melhor forma de eles serem integrados na vida académica. É da pior forma? Claro que sim, mas os Srs. Profs. não se preocupam se eles se perdem, se eles se iniciam em práticas menos correctas, porque estes chegam à sala, despejam a matéria preparada há já longos anos, em sebentas amarelecidas pelo tempo, e partem com a consciência tranquila do dever cumprido. Não posso generalizar, há profs preocupados que se preparam e ensaiam novas práticas pedagógicas (também aconteceu comigo), mas concluí a licenciatura há apenas dez anos e pude constatar muito do que aqui escrevo.
A pobre da ministra até afirma que a culpa é dos sindicatos, será, pois sei que não estão isentos de culpa, que estão a decorrer negociações, que o Novo Estatuto da Carreira Docente até vai colocar a bola do lado dos professores, que são uns ingratos e que não querem fazer nenhum. (Hoje apetece-me escrever como a Guidinha do Stau Monteiro...).
Pobre ministra! Tão mal compreendida e que tanto bem espalha à sua volta!
Os docentes, esses são uns ingratos!...

E o menino?
Bem, o menino não teve aulas.
Veio para casa.
Como não tem daqueles jogos de consolas que apenas fazem a guerram, transmitem violência e vontade de experimentar tanto em casa como na escola, tinha que aproveitar a folga da melhor maneira.
Se melhor o pensou, melhor o fez.
Virou-se para as moscas.
Pobrezitas!
Era um tal esvoaçar. Voa para a direita, voa para a esquerda e o menino na maior das alegrias correndo atrás delas.
Trabalhou toda a manhã! Claro que o trabalho era a brincadeira!
Não se cresce a brincar?
Quantos de nós não fizemos a mesma coisa?
Não estavamos amarrados a telenovelas, a jogos estupidificantes, a telemóveis... enfim éramos felizes a correr atrás das moscas, das galinhas, ...
Apanhou uma.
A avó não gostou da brincadeira...

14 comentários:

Anónimo disse...

É tudo muito bonito, sim senhor...
E os professores têm todo o direito à greve.
Agora o menino? O menino não tem culpa nenhuma e mto menos os pais.
O menino pode não ter avó nem vizinha (a maioria dos casos), e aproveitar a folga da melhor maneira é mesmo prejudicar o trabalho dos pais que obviamente não os podem deixar sozinhos em casa (os do básico claro está) e que nenhum deles se chama ministra da educação.

joaquim disse...

Cara Andante
Ontem vi na televisão um senhor do sindicato dizer que "estava muito feliz" porque a greve tinha tido enorme adesão, tinha sido um êxito.
Sem negar o direito à greve, fiquei a pensar se não teria sido mais bonito o referido senhor dizer:
"A greve teve grande adesão, correspondeu ao que desejávamos, esperemos que a senhora ministra nos oiça, porque infelizmente muitas crianças ficaram sem aulas."
Desculpa andante, mas tenho muitas vezes a impressão de dyuas coisas distintas:
uns fazem greve para defenderem os seus direitos
outros, normalmente à frente dos sindicatos, fazem greve por razões politicas.
Não sou socialista, nem sequer simpatizante, penso a mesma coisa seja qaul for o governo.
Dou-te razão, porque penso que o que muitas vezes é decidido nos gabinetes em Lisboa, nada tem a ver coma realidade.
Os meus filhos tiveram aulas porque têm "graça" de frequentarem um colégio particular.
Que ao menos a greve sirva para mudar o que está errado.
Abraço em Cristo
Joaquim

joaquim disse...

Pelo texto anterior também estou a precisar de aulas de Português!!!

Andante disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Andante disse...

Tens razão anónimo.
Deixa tratar-te assim, já que não queres mostrar a cara e não permites que te olhe bem no fundo dos olhos que são o espelho tanto do coração como da alma.

É com a alma que vou falar.
Sabes, o direito à greve é uma das vitórias do 25 de Abril. Tempo de alegria, de encontro, de partilha e serenidade. Já algumas das coisas que vieram a seguir não foram tão bonitas.
Sabes, é tão bom sonhar...
Sonhar com a liberdade.
Sonhar com a alegria estampada na cara. Deixamos de ser cinzentões.
Vieram os "cantos livres". Aqui não se falava de partidos, não se discutia com ódio, não se acusava de traidor/a (esses refugiaram-se em casa ou partiram para o estrangeiro).
Qual a razão de tudo isto?
É simples. Quando fui para o liceu, obrigaram-me a comprar uma farda, a da Mocidade Portuguesa Feminina, deram-me uma espécie de pin para pregar por cima da camisa e obrigaram-me a desfilar com o braço direito estendido (a célebre saudação nazi-fascista), e eu não gostei nem da farda nem da saudação.

Recuando um pouco mais no tempo, vivia-se o período quente da campanha do general Sem-medo, Humberto Delgado. O meu pai apoiou este candidato e não sabia que tinha que guardar para si a sua intenção de voto. Foi denunciado por um pretenso amigo, informador da pide. Já imaginaste a carga de trabalhos?
Guardo a memória do meu pai e sigo dele o exemplo de coragem e rectidão.
Talvez por que lhe sinto tanto a falta, apenas o coloco sobre o altar em todas as eucaristias e não consigo visitá-lo na sua última morada terrena. Limitações de uma andante peregrina que ainda não conseguiu descobrir muito bem o caminho desta peregrinação para o Pai.

Voltando à greve.
Talvez não tenhas memória dos tempos passados, apenas a que te proporcionam na escola, e é tão pouco!... Não esqueçamos que sou professora de História e sei como estão orientados os programas, a sua extensão e a dificuldade de abordar todos os temas, sobretudo os actuais, que quanto a mim ajudam a preservar a memória de todos os que entraram na História pelos seus actos e méritos e daqueles anónimos, como eu, que construímos a História mas que a atravessamos sem entrar para os manuais ou para serem nome de rua.

Uma greve só se torna eficaz quando chama a atenção do cidadão comum e altera muitas vezes o seu quotidiano, ex: greves de transportes, correio, médicos, ...
Entendes?
Houve contratempos? Ainda bem. Talvez os cidadãos comecem a perceber que ser-se professor não é passear os livros, não é fazer perguntas difíceis, não é apresentar teste maçudos, não é três meses de férias...
Os professores não são preguiçosos como quer dar a entender a ministra.
Uma escola fervilha diariamente com aulas, com reuniões, com consultas, entre outras actividades importantes.
Se não sabes, eu informo: as reuniões de Conselho de Turma são todas marcadas para depois das 18H30.
Semana passada houve uma reunião geral do pessoal não docente, auxiliares de educação; entraram os professores, entraram os alunos e os blocos foram abandonados, estavam em reunião.
Tenho-me vindo a informar e, sempre que há reunião,num qualquer local de trabalho, realizam-se dentro do horário de trabalho. Nós reunimos após terminarem as aulas...

Achas que te elucidei nalguma coisa?
Se continuas com dúvidas, diz que tentar-te-ei esclarecer.

Continuo em greve.

Saudações peregrinas.

Andante disse...

Joaquim, perdoa. Trabalhei durante 23 anos no ensino privado.

Talvez por esse motivo é que penso muito e muitas vezes se hie-de ou não aderir a greves.
Esta tinha que ser.
Louvo este governo por tomar algumas medidas corajosas, mas mexer co a nossa dignidade?
O professor é um educador e, como tal, tem que dizer do seu descontentamento.
A tutela, além de não compreender, fica com os cofres substancialmente mais cheios. Talvez por isso não vejamos crescer o orçamento de 2007 para a educação.
A educação é o parente pobre e o bombo da festa são os professores...

Beijos peregrinos

Gosto muito de entrar no teu blog para ouvir a música maravilhosa com que nos presenteias.
Obrigada

Anónimo disse...

O discurso sobre a liberdade tem toda a legitimidade. Por isso é que frisei na segunda frase do meu anterior comentário que os professores têm todo o direito à greve. Não coloquei essa questão em causa.

O que comentei foi o desdém com que se falou nos meninos. Porque ficam em casa a olhar para mosca. E uma greve tem de fazer efeito em alguém para ser atingida? Pois claro que tem... Mas quem devia ser atingido seria o governo e não os pais que têm de deixar de ganhar o seu dia de trabalho por causa da luta de outros. Porque, volto a frisar, nem todos têm a casa da avó para ir catar a mosca.

(obrigada pela rápida e clarificadora resposta ao meu comentário)

joaquim disse...

Cara andante
não coloquei em causa o direito à greve e não o faria, mas apenas a diferença entre aqueles que a fazem legitimamente e aqueles que dela se servem para fazer politica.
Absolutamente de acordo e ao parente pobre da Educação, junto a parente pobre da Saúde.
pelos vistos é onde é mais fácil ir "sacar" dinheiro, que aos bancos,não, que se podem "zangar" e depois nunca se sabe.
Abraço em Cristo

Paulo disse...

Gostei deste espaço. Linkei-o e vou voltar

Andante disse...

Caro/a anónimo/a

Saí há bem pouco tempo da casa do menino e é vê-lo todo feliz porque já apanhou mais duas moscas...

Quer estudá-las e fazer criação.
Espírito de estudante, é curioso e quer perceber como as coisas são.

Se todos fossem assim não havia insucesso e os professores nunca quereriam fazer greve...

Saudações peregrinas ( envio um beijo peregrino, como é costume, porque nunca se dá um beijo a uma pessoa desconhecida...)

Andante disse...

De acordo Joaquim.

Beijos peregrinos

Andante disse...

Obrigada Paulo.
Volta sempre. Também te vou visitar com frequência

Beijos peregrinos

Catequista disse...

Concordo com a Andante. Também sou professora e até concordo com algumas das medidas que a ministra apresenta. ´Por outro lado não concordo com algumas coisas de que nos acusam. Como em todas as profissões há bons e maus profissionais. Estive em luta, porque penso que devo defender os meus direitos. O facto de os alunos não terem tido aulas talvez sirva para alertar alguns pais daquilo que os professores estão a viver.

Andante disse...

Obrigada catequista.
Gostei de te ver por cá

Beijos peregrinos