21/09/2008

Peregrinação


Ontem e hoje vou a caminho…

Alguns companheiros rumaram, em peregrinação, para Santiago. Servi-me dos pés deles e vou a acompanhá-los.

A Ana, menina bonita, responsável e sensível, já fez uma vez o Caminho. Hoje, apenas duas jornadas! O trabalho e as obrigações não lhe permitem voltar a fazer o percurso na sua totalidade.

 

O Caminho de Santiago tem para mim um sentido muito especial.

Não só por que o estudei, mas pela vontade que me ficou de o fazer.

O Caminho foi e é o ponto de encontro de culturas, de saberes e de experiências.

É aliciante saber que por ali também se forjou a cultura ocidental, peregrinaram reis, rainhas e o mais comum dos mortais, que a História deles não faz memória.

Só me foi permitido fazer apenas uma jornada, a maior.

Tive que abandonar a peregrinação em que me queria debruçar sobre mim mesma, conhecer e conhecer-me. Experimentar a alegria da vitória, isto é, de chegar pelos meus meios a um local tão cheio de vida, animação e de alegria. Vencer-me a mim própria.

O meu objectivo era apenas a compreensão desta peregrinação, o crescer para Ele e n’Ele. Chegar à Galiza, junto do pseudo túmulo do Apóstolo, respirar fundo e poder dizer que me deixei ligar ao Homem medieval que, vindo do interior Norte, queria estabelecer uma relação com o mar oceano, local onde o Sol se põe.

Esta não é uma peregrinação qualquer!

É uma peregrinação adoptada, adaptada e apropriada pelos povos pagãos que viajavam ao Finis Terrae, para ver o fim da Terra e o local onde o dia dava lugar à noite, pois o sol desaparecia no oceano imenso. Como prova da missão cumprida, transportavam a vieira, concha de um molusco com o mesmo nome, comestível e abundante na costa da Galiza. A vieira servia de prova, mas também passaria a servir como concha pela qual se matava a sede.

Quando o Caminho foi cristianizado, passou a ser parte integrante dos sinais do peregrino, pelas mesmas razões.

Em tempos de Reconquista cristã em que o inimigo era o infiel, o que acreditava noutro Deus, o bárbaro, enfim, aquele que trazia consigo a morte, a fome, a descrença num deus que de tempos a tempos se ausentava e deixava a humanidade abandonada à sua sorte. É neste contexto que se justifica o achamento do túmulo do Apóstolo e que se vai justificar o grito de guerra dos cristãos:

- Por Santiago aos mouros!

 A Reconquista foi feita, à semelhança de outras guerras, de avanços e recuos e, Almaçor, chefe mouro, chegou a saquear a catedral, tendo levado todas as suas alfaias para Granada.

 Reconstruída, chegou aos dias de hoje, também com ‘mexidas’ no seu corpo, sobretudo durante o barroco, e é estudada como paradigma de uma igreja românica.

 

A minha vontade de fazer a peregrinação não se prende com promessas, nem com quaisquer negociatas, prende-se apenas com a vontade de saber e conhecer



1 comentário:

Anónimo disse...

"O Caminho é como a vida:uns dias anda-se mais, outros menos;num atina-se com o caminho, noutro perdemo-nos".
Já acompanhei, em etapas soltas , por duas vezes, peregrinações a Santiago, com partida em Gaia. É extremamente edificante o sentido de solidariedade , partilha e convivência fraterna, que se cria entre peregrinos,familiares e amigos que a eles se juntam e as gentes que os acolhem ao fim de cada etapa.. Além disso, tudo o que se aprende de História, de Arte, todo a paisagem que nos encanta os olhos e a alma...e mais, o cuidado e o interesse cultural que a Xunta de Galicia pôe na conservação e sinalização dos "camiños".que foram semente de cristianismo.
Gostei de vir a este teu cantinho. Foi a primeira vez. Não será a última...Glória